quinta-feira, 4 de outubro de 2007

monja coen

Budismo
Meditação em movimento

Em São Paulo, monja consegue reunir mais de 100 pessoas em caminhadas que buscam autocontrole e harmonia
Cristiana Felippe
Da equipe do Correio


Fotos: Marcos Fernandes
o passeio dominical começou com menos de dez pessoas e hoje já consegue reunir mais de 100 seguidores
Depois da caminhada, os participantes reverenciam o céu e a terra

São Paulo — Frequentadores dos parques de São Paulo costumam se surpreender, nas manhãs de domingo, quando encontram uma senhora careca liderando uma fila indiana de cerca de 40 pessoas, todas em silêncio, caminhando durante uma hora. Embora o grupo não pronuncie uma única palavra durante o passeio, atrai olhares curiosos. A primeira impressão é a de que seja um grupo de loucos ou fanáticos religiosos.
  Nada disso. Trata-se da Caminhada Zen da monja Coen Murayama. Jornalista nos anos 60, a brasileira abandonou tudo e buscou o caminho do budismo, nos Estados Unidos. Depois, passou oito anos no mosteiro de Nagoia, no Japão. No Brasil, já foi presidente do Conselho da Comunidade Budista Soto Zenshu da América do Sul e líder espiritual do templo Busshinji de São Paulo. Hoje dá aulas sobre o budismo no centro de estudos filosóficos Pala Athenas e está batalhando para fundar o seu próprio templo.
  Aos 54 anos, a monja tem inovado a técnica de meditação no Brasil, incentivando essa prática por meio de caminhadas pelos parques de São Paulo. ''Para meditar não é preciso ficar sentado horas dentro de um templo de olhos fechados'', diz. Com seu olhar doce e forte, ela acaba cativando as pessoas e está ganhando cada vez mais seguidores.
  
CAMINHADA ZEN
O grupo das caminhadas começou em maio deste ano com apenas oito pessoas, já adeptas ao zen budismo. Atualmente, consegue em alguns encontros reunir mais de 100 pessoas, vindas de diversas religiões. Eles se encontram todos os domingos às dez horas da manhã em um parque da capital. A caminhada começa com dez minutos de meditação.
  Depois, sempre seguindo os passos da monja, os participantes algumas vezes páram e formam uma roda para reverenciar o céu e a terra. ''A gente já está programando até levar capas e guarda-chuvas, para não perder nenhum domingo, devido ao mau tempo'', conta Noemi Catalano, uma das frequentadoras assíduas e seguidora do budismo. ''Meditar caminhando me faz muito bem'', ressalta.
  A monja acredita que esta é uma boa maneira de levar o budismo e a prática da meditação a quem nunca entrou num templo, onde o acesso é limitado. ''Esta foi a forma que encontrei de ajudar as pessoas a lutar contra o estresse e a violência'', afirma Coen. ''Além disso, é uma maneira de elas aprenderem a respeitar o desconhecido'', diz a monja, referindo-se aos olhares de espanto das pessoas.
  Meditar caminhando pode ser uma novidade para os brasileiros, mas há pelo menos 20 anos é uma experiência muito utilizada na França. Lá, o monge vietnamita Thich Nath Hann consegue reunir centenas de pessoas na chamada meditação em movimento. Ele serviu de inspiração para Coen adotar esta prática também no Brasil. ''A idéia é que, a cada passo, a gente sinta a própria respiração, o ar a nossa volta, os sons e os odores'', reflete a monja. Em alguns encontros eles também costumam abraçar as árvores. ''A natureza nos dá tanta energia e não pede nada em troca, deveríamos fazer o mesmo com o nosso semelhante'', frisa.
Por gratidão a Buda, a monja repetiu o seu gesto de raspar a cabeça para dizer que não pertencia a casta nenhuma. Sua paixão pelo budismo começou quando ainda era a repórter Cláudia Batista, do Jornal da Tarde, em São Paulo. Eram os anos 70, uma década de protesto e, no auge do movimento hippie, muita gente meditava.
  Nessa época, as imagens de monges budistas meditando enquanto seus corpos queimavam (durante a guerra do Vietnã) chamaram a atenção da jornalista. Ela queria compreender como eles tinham tanto autocontrole. A leitura do livro Autobiografia de um Yogue, do autor Paramanhansa Yoganda, foi outro grande estímulo para que ela iniciasse sua formação monástica no Zen Center of Los Angeles, na Califórnia.

Mosteiro feminino
Depois de três anos de prática constante nesse local, recebeu a ordenação do falecido Reverendo Koun Taizan Daiosho. Em 1983, Coe entrou para o mosteiro feminino de Nagoya, no Japão, com sistema de internato nos primeiros cinco anos e semi-internato nos últimos três anos de mestrado. Lá acordava às quatro horas da manhã para rezar e meditar durante horas. Também lia muito sobre o budismo.
  Outro importante trabalho da monja Coen é sua participação em encontros inter-religiosos, onde debate com líderes espirituais de várias religiões orientais e ocidentais. O objetivo desses encontros é promover a paz no mundo. ''Os seres humanos são diferentes e por isso é importante que existam várias religiões'', acredita a monja. ''Precisamos aprender a respeitá-las, se fizéssemos isso evitaríamos muitas guerras'', completa.
  A monja talvez consiga entender as diferenças entre as religiões e aceitá-las, porque já enfrentou o preconceito religioso. Ela veio de família católica, que demorou para aceitar sua decisão de se dedicar ao budismo.
 Conversar com a monja Coen não é apenas aprender sobre a cultura oriental, mas ter uma verdadeira lição. Ela dá a impressão de ter vivido muitas vidas em uma só. Coen casou-se três vezes. A primeira, com um rapaz sete anos mais velho, quando tinha apenas 14 anos e era uma adolescente espevitada e precoce. Seu segundo casamento foi com um norte-americano, no período em que viveu nos Estados Unidos. Por último apaixonou-se por um jovem japonês, o monge Shozan, com quem morou no Japão e depois viveu alguns anos aqui no Brasil. Do primeiro casamento nasceu sua única filha, Fábia, hoje com 37 anos. Devido à opção religiosa de Coen, a garota teve pouco contato com a mãe e foi criada pela avó.


SERVIÇO

Caminhada Zen da monja Coen
Todos os domingos às 10h da manhã nos parques de São Paulo e-mail: caminhadazen@hotmail.com  

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